1 – Quando ocorreu seu contato inicial com o universo do desenho artístico?
Desenho compulsivamente desde que me conheço por gente. Devo ao meu primo um contato maior e inicial com um desenho mais artístico. Eu tinha acabado de voltar de um ano morando na Califórnia, surfando e trabalhando, onde já tinha ido com a intenção de finalmente começar um trabalho mais profundo de desenho de escritos literários. Quando voltei, morando em Ubatuba, um dia meu primo apareceu para passar um tempo lá, com uma turma grande de artistas amigos dele, todos do Grupo Bijari de arte, que ainda existe. Ficamos dias desenhando em conjunto e pude reviver aquele sentimento que tinha ao desenhar quando criança. Eu tinha uns 21 anos. Meu primo nessa época era auxiliar do artista Dudi Maia Ros a e então fui fazer aulas com o artista, fiz muitas aulas, do desenho a pintura. Nunca mais parei. Acho que a vida vai acontecendo assim, meio misteriosamente, algumas coisas parecem ser predestinadas.
Acredito que meus desenhos tem alguma influência e diáogo com os artista da Escola Brasil, da qual o Dudi participava nos anos 60/70.
2 – Quais são suas influências no campo da arte?
Muitas coisas mesmo pois tento absorver o máximo de informações, da arte dos povos mais primitivos aos contemporâneos. A visão clássica da arte, da qual, ao meu ver, a arte contemporânea é herdeira, mesmo que as avessas, com certeza é uma grande influencia para mim. O Barroco também, um tanto de pintura Bizantina. Posso citar artistas como Michelangelo, Rafael, Tintoretto, Caravaggio, El Greco, Willian Turner, Willian Blake, Mondigliani, e muitos outros.
Tudo isso tocando o infindo mistério que abrange o ser e busca um eco, a expressão.
Minhas vivencias, no mar, na noite e na vida, assim como a literatura, também influenciam os desenhos. Ou seja, tudo.
3 – Seus desenhos expressam a busca pelo que antecede no tempo toda a forma de acontecimentos humanos, como gestos, vivências, projetos, sentimentos. Comente esse aspecto de sua arte.
Sim, sinto isso também. O próprio desenhar é um gesto, o traço é um gesto e os desenhos enfim, em sua sintaxe, parecem representar gestos humanos. Gestos por vezes melancólicos, alegres, meditativos, angustiantes. Muitas vezes tento fixar a angustia, a treva, que escapa...
4 – Há uma dimensão instável em seus desenhos, como se a realidade antes do fato fosse permanente em seu anseio de concretização. Um projeto inacabado. Um desfecho nunca alcançado que revela de certa forma uma dimensão provisória em seus desenhos. Comente.
Sim, algo que aponta para esse mistério, o inacabado que é também um lugar, que aponta para algo de infindo, no gesto drástico que se abre por si mesmo. E na sintaxe dos gestos humanos representados, talvez um jogo com a arte grega, antropocêntrica. Mas sempre esse traço, esse gesto que aponta, como tudo que existe, para aquilo infinito, que não é tempo nem espaço, no entanto também não é porvir, nem passado. Mais extremo que o mais extremo dos gritos, que não é grito, as imagens se abrem para isso em seu pequeno grito. Mais leve do que o mais leve elemento que existe no universo, mais leve até que a poética. A arte e sua poesia devem apontar, em gesto oblíquo, para isso. Também gosto de estudar a simbologia tradicional, talvez um dia ela entre em minha arte.
5 – Em seu trabalho artístico você tem dialogado com a literatura, podemos citar como exemplo poetas e escritores como Jorge Elias Neto, Stefanni Marion, Andre Setti, Alexandre Bonafim, Lily Falcão, Beatriz Bajo e Ana Paula Maia. Comente a relação existente entre seus desenhos e a obra literária.
Isso vai de encontro com o que eu disse sobre como as coisas acontecem misteriosamente em um certo sentido. Logo na época em que estudava desenho com o Dudi fiz um curso de teatro onde conheci o poeta Andre Setti, e dai começamos uma imensa ( em muitos sentidos) interlocução artística. Ilustrei seu primeiro livro e então de vários outros escritores, na sequência.
A interlocução artística, principalmente quando entre diversas formas de expressão, é para mim algo fundamental e belo, me sinto um privilegiado por essas amizades e trabalhos. Como sou também poeta isso tem um significado ainda maior, como um ciclo, acabei ilustrando meus dois primeiro livros de poemas também.
Em outras entrevistas que dei sempre percebi e disse que dar uma entrevista é por si só uma arte. Essa é a primeira vez que respondo como artista plástico. O interessante e surpreendente é que respondo como se fosse uma outra pessoa, assim como, muitas pessoas já perceberam, meus desenhos e pinturas, parecem ser feitos por uma outra pessoa, que não a mesma que escreve os poemas. Talvez eu concorde, mas isso por que são mesmo formas muito diferente de expressão, que em algum ponto são a mesma coisa. Não cabe aqui falar sobre algumas diferenças que acredito existir, mas as semelhanças, e mesmo o por que de insondaveis diferenças, fazem parte desse mistério que não ouso desvelar. Somos muitos e um, assim como os desenhos.
Ainda quero migrar, como eles.