segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

ENTREVISTA COM O PINTOR (ILUSTRADOR) GABRIEL FERREIRA




1 – Quando ocorreu seu contato inicial com a pintura?



Comecei a desenhar aos 3 anos de idade, contudo, só aos 8 que o desenho se fez uma predileção pessoal e uma tendência artística. O contato com a pintura começou com o lápis e as tintas secas, pois o desenho sempre foi e é a minha maior paixão. A pintura, como se vê hoje em meu trabalho se deu quando eu fui “batizado” artista com as primeiras exposições. Então, como algo bem natural e de forma “autodidata” iniciei o contato com a têmpera e o acrílico por serem tintas de secagem rápida, uma vez que, eu estava habituado a ter resultados rápidos e trabalhos prontos para serem expostos.


2 – Quais são suas influências no campo das artes plásticas?


Na pintura sempre tive paixão por grandes clássicos da pintura mundial e posso aqui destacar alguns que, de fato, me despertaram e até hoje me despertam o entusiasmo, como Cândido Portinari, Carybé, Rodin, Carlo Barbosa, Salvador Dali e Di Cavalcanti. Mas, não posso deixar de citar artistas que estão próximos a mim e exercem influência até hoje, como Pirulito e Suzart, ambos do Recôncavo da Bahia.



3 – Suas telas mesclam elementos religiosos de origem afro, além de uma dimensão metafísica no que se refere ao amor em sua dimensão corporal. Comente essa perspectiva de sua pintura.



Tenho muito afeto e encanto pelas religiões de matriz africana, para além de ser um viés familiar, cultuo os efeitos sincréticos que o povo brasileiro produziu para poder sustentar as suas crenças. Quando se fala em artes plásticas e, principalmente do meu trabalho, evoco o corpo para expressar tais manifestações, pois, quando misturo capoeira, samba de roda, candomblé e até mesmo erotismo, sinto nesse bojo cultural e multifacetado, muita dança, poesia, música e espiritualidade; uma espiritualidade que está intimamente ligada à paixão que se tem pelos cultos às entidades, aos pares e à coletividade que os faz agregar.



4 – Sua pintura tem se relacionado tematicamente com a poesia. A relação pintura poesia seria dicotômica, ou há uma dimensão comum a ambas as artes?



As linguagens artísticas parecem ter nascido do mesmo ventre, pois, é forma que o ser humano se dispõe a se expressar quando não o faz por forma e imposição do “modo de produção capitalista”; assim quando se fala de poesia e pintura a dicotomia só se abriga no que é bom e ruim - postos frente a frente. O meu trabalho está alçado à poesia por conta do grande universo imagético que a literatura proporciona. Quando a leitura se faz percolada por encantamento, se materializa um mundo cheio de imagens; assim, me aproprio dessas imagens para produzir, pois, não há inspiração para artes plásticas que não seja acionada após uma boa leitura. Por isso tenho poesia, contos, cordel e até mesmo a oralidade como lastro para a minha pintura. Sou um ilustrador!



5 – Como você vê a dimensão figurativa e abstrata na pintura?


Não sou um bom entendedor dessas questões figurativas e/ou abstratas, sou mais um produtor de arte e, no meu labor pictórico nordestino, entendo que a representatividade artística tem de haver, antes de tudo, identidade. Uma figuração mal feita é tão feia como uma abstração mal feita, independente de quem a realizou. Estou fixado na arte que comunica alguma coisa, na arte que fala por si só sem precisar de muitas notas de roda-pé e explicações detalhadas. As questões que se relacionam à arte contemporânea ainda não me foram absorvidas, uma vez que, dentro das discussões de conceito artístico a introspecção do artista o distancia das “causas”. Artisticamente sou par da militância, pois, o artista também provoca transformações sociais e não precisa levitar ou querer ser considerado um extraterrestre para ser reconhecido. Pés no chão e militância política fazem um bom artista, também. Dessa forma a dimensão que encaro a cerca da figuração e da abstração é de que a arte tem que ser de responsabilidade e não um campo para aventureiros.


6 – A pintura ainda estaria sobre a influência determinante da arte abstrata? Por que tantos pintores optam por essa vanguarda renegando de certa forma a figuração como uma dimensão quase que secundária nas artes plásticas?


Como havia mencionado na resposta anterior, esses assuntos me fogem um pouco ao entendimento, pois, não parto para essa “bola divida” com outros artistas, sejam eles vanguardistas e tradicionais (como eu!) e, também não estou no hall destas discussões, infelizmente... estou sem tempo (risos). Mas, o que posso inferir é relatando que faço o meu trabalho – seja semi-abstrato ou figurativo – ligado ao texto; então, para onde o texto me levar eu vou, sigo a trilha das letras e dos arranjos literários que elas desenham, dessa forma fico feliz com o meu trabalho e agradando – ou pelo menos tentando – às pessoas que se dispõem e me entender (risos).



Um comentário:

  1. Gabriel Ferreira é um artista excepcional! Porém, dizer isto a respeito de qualquer outro é muito fácil, numa época em que temos artistas aos quilos, e por metro quadrado, perambulando por nossas ruas e galerias, enchendo-nos os olhos com suas abundantes colorações performáticas e, de igual proporção, vazias e efêmeras. No caso de Gabriel, a coisa muda de figura.

    Este tanquienhense é um artista ligado às tradições, pois, um artista, precisa de algo para se apoiar, e isto está muito claro desde Da Vinci a Portinari, por que com ele haveria de ser diferente? O folclore, a vida pacata do interior, a cultura popular de um modo geral estão para a obra de Gabriel da mesma forma que as cores e as impressões luminosas estão para a obra de um Monet ou um Sisley. Mas cores também não são seu fraco, pois Gabriel equilibra cores e contorno com a simplicidade primordial do desenho, aliado ao acabamento técnico e expressivo das tintas sobre as telas, que conseguem juntar o abstracionismo e figurativo em uma tênue barreira aliada aos malabarismo imagéticos do artista.

    Suas telas também não se limitam em serem uma acabada fotografia de um momento contemplativo, antes, o movimento com que se deixam olhar e irradiam de si, nos esclarece ainda mais a idéia de que um quadro ainda precisa nos dizer, contar-nos algo, ou melhor, nos instigar a procurar os segredos que em nós habitam o quadro. Por estas e muito mais coisas que o espaço e os limites desta conversa não me deixam detalhar, Gabriel é um grande artista, porque um grande artista deve estar sempre vivo e atento ao mundo que o cerca e deve capturá-lo e o dissecar da maneira mais minuciosa o possível, para que a posteridade saiba que ali se encontrava um transformador de mundos e não um falsário, por isso mesmo o poeta Ildásio Tavares, disse que sua arte é uma arte “honesta, sem truques nem conceitos em que as imagens são tratadas com esmero artesanal para um final de perfeita solução plástica expressa por uma mão segura de um hábil colorista; não se esconde atrás dos modismos tão encontradiços no momento presente; parte para uma definida vocação de pintar e realiza seu desiderato plasticamente, através de sua habilidade no manejo de pinceladas às vezes vigorosas, mas nunca frouxas, nunca guiadas pelo acaso”.

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