(Giulio Pipi)
UMA PRAGA SEXUAL
Praga da gota serena
quando não cega aleija.
Catimbó pra ter valor
leva o tempero da inveja,
e poeta de segunda
os veros versos sobeja.
Quando o sertão abreja
c'uma chuva de três dia
marreco no céu voeja,
faz serenatas a jia,
e vaqueiro aboiador
bota pra fazer poesia.
Quanto pega a cantoria
dá trabalho a terminar:
histórias do fim do mundo
novelo vai revelar
se o cego velho na feira
bota pra improvisar.
O leitor ouviu falar
em Chico de Bagafu?
Ou já usou um colar,
semente de mulungu?
Já viu gente se irritar
e mandar tomar no cu?
Me meti num sururu
lá na casa do Capeta.
Fui com Maestro Chiquito
- excelência da corneta
que já tocou na orquestra
do Velho Bode Perneta.
Girando qual carrapeta
menina querendo dar.
Cheia de paixão na alma,
o corpo inteiro a viçar:
se passar perto de mim
eu não posso dispensar.
A beleza de um olhar
em um rosto feminino
encanta que nem cristal
- olho d'água cristalino -
veio de lágrima, desejo,
força matriz do destino.
Quando Zefa de Rufino
deu cria à menina Rosa
choveu por bem 7 dia
lá no sertão de Viçosa;
por 3 semanas de feira
matuto foi todo prosa.
Cresceu a menina rosa
desabrochando o botão
da beleza que guardava
na forma com precisão:
seu semblante a quem o via
disparava o coração.
Ouvi dizer, no sertão,
que uma certa Benedita
- feia, gorducha e idosa -
chamava Rosa "A Maldita",
nela buscando vingar-se
da sua triste desdita.
Boneca de Afrodita
ela espetou pra Xangô;
acendeu seis vela preta,
uma galinha sangrou,
e a alma de Rosinha
ao Diabo encomendou.
Algum tempo se passou
antes da Revelação;
todos respeitavam Rosa,
lhe tinham muita afeição:
ninguém ali suspeitava
que tinha parte com Cão.
Apois foi na procissão
que Rosinha endoideceu.
Tomou cruz de mão de padre
e a todo mundo benzeu;
abriu os braço e gritou:
- "Aqui quem manda sou eu!"
Quando Rosa enlouqueceu
passou a noite a amar:
deu a matuto e letrado
e ao doutor do lugar.
Engravidou do vigário
de uma vila à beira-mar.
E mandaram me chamar
para uma internação.
Lá reinava a bacanal
- ímpetos, louca paixão -;
quem enrabava Rosinha
agora era o sacristão.
Ouvi a explicação
que sábio doutor me deu:
- "Teve uma revelação
aqui na casa de Deus:
o amor na comunhão
serviu a pobres plebeus;
mesmo os juramentos meus
ela jogou sobre o piso;
dou o meu depoimento
e assumo o prejuízo:
a beleza do seu corpo
desnudou meu desjuízo." -
Pra levá-la foi preciso
reforço policial.
Ouvi muitos palavrões
em protesto radical;
um brutamontes matuto
lá quis me quebrar no pau.
Eu consegui afinal
internar a tal Rosinha;
depois de bem medicada
ela ficou boazinha.
Está bem, a estudar
- vive insistindo em me dar,
mas não como a taradinha.
Bravo!!!
ResponderExcluirAntônio Adriano é poeta sertanejo, da gota serena!...
Uma produção vastissima e de uma lingua afiada das boas.
Sonetista, cordelista, contador de estórias e histórias.
Parabéns Hilton!
Gostei da dimensão satírica desses poemas...lembra os poetas barrocos...as sátiras de alguns bardos... Muito bom...já tem mais...
ResponderExcluirAgradeçemos, eu e minhas duas mulheres de bruma, estarmos numa casa e companhia tão nobres. As duas me pediram para dizer que não falam nada "mode a gente inté ter ficado mei onabulada"
ResponderExcluirabraço,
Antônio Adriano de Medeiros