“Sou apenas fragmento, enigma e pavoroso acaso”.
Fernando Pessoa
I
escuto escuro – sombras surdas –
no espaço espesso
lodo torvo
de um tempo esquivo
em que começo e recomeço
o pugilato
comigo mesmo
luta ou luto
que me cega e segue
como treva ou trava
ao vento curvo.
II
verde é o segredo
verde é o silêncio
escrito em cicatriz
escrito em anti-flor-de-lis
– para a necessária
abolição de mim –
III
estou morto e não-morto
vértebras ao inverso
letras tontas
de um nome incerto
vocábulo equívoco
desfeito em água
– para a necessária
abolição de mim –
escuto espesso – sombras mudas –
no escuro escuro.
IV
nada me aquieta
entre espectros
de palavras-coisas:
anêmonas trafegam
pensamentos rotos,
roídos até o muco
– eis a era desolada
de cortes e recortes
tempo-cutelo
no espaço lacerado
pele-de-lua violada
por línguas-gárgulas
lua-esfinge-macerada
por caninos cérberos:
tempo nigromante
– corvo corvo corvo
recrocitando escárnios.
V
“quando nada mais faz sentido” –
busco o mistério animal,
a ferocidade da noite:
deslizando por meus lábios,
ela se transforma, revoluta,
desentranhada, não me decifra,
não te devoro, abisma fábulas
na desordem dos cabelos;
entre pupilas, expandindo luas,
tensionando a pele, na cegueira dos mamilos.
VI
floresta de enganos, se me esmagam,
furiosos, com simulações,
é tua face que me escapa à pele;
se atravesso veredas infernais,
desalentado, paisagem de fraturas,
é apenas para encontrar-te,
tua imagem reversa é o meu labirinto.
VII
espaço vegetal, tempo lagarto:
mãos fluidas; voz movediça;
olhos de musgo, na pedra;
quem sou eu, nessa era líquida,
menos homem que número,
letra negra, fragmento do caos,
movendo-me à roda de teu nome?
Fernando Pessoa
I
escuto escuro – sombras surdas –
no espaço espesso
lodo torvo
de um tempo esquivo
em que começo e recomeço
o pugilato
comigo mesmo
luta ou luto
que me cega e segue
como treva ou trava
ao vento curvo.
II
verde é o segredo
verde é o silêncio
escrito em cicatriz
escrito em anti-flor-de-lis
– para a necessária
abolição de mim –
III
estou morto e não-morto
vértebras ao inverso
letras tontas
de um nome incerto
vocábulo equívoco
desfeito em água
– para a necessária
abolição de mim –
escuto espesso – sombras mudas –
no escuro escuro.
IV
nada me aquieta
entre espectros
de palavras-coisas:
anêmonas trafegam
pensamentos rotos,
roídos até o muco
– eis a era desolada
de cortes e recortes
tempo-cutelo
no espaço lacerado
pele-de-lua violada
por línguas-gárgulas
lua-esfinge-macerada
por caninos cérberos:
tempo nigromante
– corvo corvo corvo
recrocitando escárnios.
V
“quando nada mais faz sentido” –
busco o mistério animal,
a ferocidade da noite:
deslizando por meus lábios,
ela se transforma, revoluta,
desentranhada, não me decifra,
não te devoro, abisma fábulas
na desordem dos cabelos;
entre pupilas, expandindo luas,
tensionando a pele, na cegueira dos mamilos.
VI
floresta de enganos, se me esmagam,
furiosos, com simulações,
é tua face que me escapa à pele;
se atravesso veredas infernais,
desalentado, paisagem de fraturas,
é apenas para encontrar-te,
tua imagem reversa é o meu labirinto.
VII
espaço vegetal, tempo lagarto:
mãos fluidas; voz movediça;
olhos de musgo, na pedra;
quem sou eu, nessa era líquida,
menos homem que número,
letra negra, fragmento do caos,
movendo-me à roda de teu nome?
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