(De Chirico)
O silêncio na Torre
é absoluto.
Do provisório território máximo
do Marco,
entre o reino dos réus e o dos céus,
vê-se o compulsório
Cristo - em ouro, pedra, bronze e nos vitrais -
das catedrais,
vê-se o mau ladrão no rio Tibre, que no italiano - fiume
Tevere - permite ao Poeta dizer que
o bandido faz ali seu thriller,
enquanto o outro faz a oração, entre lírios e constelações
de círios
que se vão,
acesos,
em procissão,
das ruas de Fátima e Lourdes às de Medjugorje e Czestoshowa
( mesmo que chova ),
passando por Guadalupe e Caravaggio, Loreto e Aparecida,
até que prospekt passa a
ser o nome que Dostoievski dá
pra avenida.
O pão de uma famiglia
é simbolicamente apunhalado em Óstia,
pela máfia da Sicília.
Um arquipélago de mosteiros aflora acima das nuvens,
em Meteora!
Graciosas Graças dançam no quadro de Botticelli,
na Itália,
e outras Graças - grandes -, no de Rubens,
em Flandres.
Chega Händel regendo o coro no
magnífico oratório Messias, em que britânicos
– reis e milordes - aplaudem the King of kings, Lord of
lords!,
que torna o
Filho de Deus um dos seus.
A escadaria desce da sinagoga
e,
nela,
a ku-klux-klan,
sinistra,
que parte pra
caça crística.
E lá vêm o sol e a chuva,
feitos alma e viúva!
Lá vem o bambino,
com mamma e babbino,
na Piazza di San Marco,
Veneza,
e é por eles içado,
levado pela leveza,
e seu gargalhar,
straordinàrio,
provoca aplausos dos pombos,
que partem pro campanário.
Aí,
no penúltimo andar construído,
o Poeta,
distraído,
sente
de repente,
que Deus - invisível
como o vento ( mesmo quando violento ) - e o Demônio (contido nos seus
neurônios) lhe dão a fala ( ante o corpo
de César ),
que celebrizará
Marco Antônio.
Aí,
o Bardo
sente o
plano inteiro da peça
na mente,
larga a pluma,
sopra o
lume,
olha, pleno, por um segundo, com certo ciúme, pro céu sempre
novo,
por mais velho
que esteja o mundo
e,
no alto do Globe,
vê a bandeira de
estreia do novo espetáculo de grandes batalhas (dos bons contra os eternos
canalhas) e da retórica histórica,
vê a plateia
histérica, eufórica.
Vê,
do alçapão que se chama Inferno,
Hell,
no tablado,
surgir o espectro de César,
amortalhado,
e ouve trovões que vem do teto,
de nome Heavens,
Céu.
Vê,
então,
com estupor,
que ocorre o choque, no palco, entre quem mata e quem morre,
maior, na sua mente,
do que o elenco pode compor,
graças às falas que ele cria,
intensas,
que, logo, ali, fazem - tão
densas - dos milhares que não vê em
cena,
os zeros de uma cifra imensa.
Macbeth aparece acima,
com olhar de fera que à presa espera
e fulmina.
O estado - alterado - de consciência, que marca o enlutado Príncipe
da Dinamarca,
faz com que seu contato imediato de terceiro grau com o provecto
espectro do pai se estabeleça
e a tragédia – infernal - aconteça.
O surto psicótico de Lear é tão evidente,
mesmo latente,
quanto um belo cello no
velho estojo que o traz no bojo.
Otelo leva
as mãos ao Cérbero,
no revérbero
do ciúme,
e afia – do
cutelo - o serrilhado gume.
Aranhas
sabem de teias
e aves,
de rotas e ninhos.
Mas aves não sabem de redes,
e aranhas
desses caminhos.
Só os homens vão para a cruz,
só os homens matam moinhos,
e têm,
no aberto deserto,
o níveo – daí que raro – cume do Kilimandjaro,
que é o Bardo,
que nos deixou um padrão – tão excessivamente alto -
que é
um fardo.
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