sábado, 24 de abril de 2010

APRESENTAÇÃO DO POETA SILVÉRIO DUQUE POR GUSTAVO FELICÍSSIMO


SILVÉRIO DUQUE


A poesia de Silvério Duque é muito refinada, alquímica, tecida com engenho e arte, em que o poeta apresenta-nos uma alternância riquíssima de perspectivas e expressões dramáticas do contrário, bem diversa e não apenas catártica, resultando em um canto verdadeiro, uma unidade e uma realidade concreta. Trata-se de uma poesia muito superior ao que nos vem sendo apresentado pela maioria dos poetas contemporâneos.



Pr’ uma aquarela à Carlos Pena Filho


à Senhora Claudia Cordeiro, un souvenir...


Por que pintei de azul a nossa estrada?
Por não trazer um céu sobre os sapatos.
Então, busquei, em gestos insensatos,
despir, do azul, o Azul da madrugada.

Para exigir então o azul ausente,
que se espargiu em tuas alpargatas,
roubei de ti o azul das coisas gratas,
que, em teu olhar, nasceu tão simplesmente.

Mas, vestidos de azul, nem recordamos,
haver tantos azuis que azuis se amassem,
qual o Mar e o Céu, no azul, nos espelhamos...

E, perdidos no azul, nos contemplamos,
porque, do azul, as coisas sempre nascem,
pois, no morrer do azul, nós retornamos.



A pele de Esaú (Poema 04)


E o que eu adoro em ti é a tua carne,
porque tudo o que é vivo se deseja;
assim, desejo em ti o meu tormento
que há-de crescer na proporção do tempo.

O que eu almejo em ti é a tua sombra,
pois toda boca habita as mesmas vozes
que hão-de tecer com gritos o teu nome
na tarde azul tragada pela noite.

Beijo o teu rosto como se existisse
algum lugar pr’além do Precipício,
e, junto ao gosto de teu lábio esquivo,

uma palavra, sobrescrita em sangue,
há-de adornar o verso em que eu me esqueço
e há-de extirpar, do amor, a fúria imensa.



Soneto ao Vaqueiro

ao amigo e velho vaqueiro consangüíneo, Miguel Carneiro


Esquecidos, no vento, procuramos
por aquilo que outrora fomos – tanto
faz se a luz que nos guia agora é pranto,
se tudo se desfez... Nós perduramos.

Tudo torna a viver, e reencontramos
a força de existir, o próprio encanto
que transfigura o nosso grito em canto
oportuno, o caminho pr’onde vamos:

é a memória a deter a nossa sina
de ter, nos pés, os giros que há no mundo
e a vontade de amar que o Amor ensina,

porque a alma há de fazer sua própria sorte
ante o esplendor mais límpido e profundo
ou do anjo frio que nos trará a morte.


Silvério Duque é baiano de Feira de Santana. Licenciado em Letras Vernáculas pela Universidade Estadual de Feira de Santana é professor e também músico, clarinetista. Tem publicado dois livros de poesia: “O crânio dos Peixes”, 2002; e “Baladas e outros aportes de viagem”, 2006. Neste mês de Maio, dia 06, lança “A Pele de Esaú” pela Via Litterarum em Feira de Santana, após em Salvador.

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