quinta-feira, 13 de setembro de 2012

DIEGO TARDIVO: POEMA


(Félicien Rops)
 
 
NÉON
 
 A noite se enluta, pequena hóstia vacilante
Que  penetra o aroma e cuida dos arbustos heréticos;
Agora sois vós, devolvidos à pátria e aos prazeres
Que arderão nas entranhas de vossos pensamentos.
Quanta ternura desperdiçada, quantas noites tristes!
Acalentando suplício para os cantores da fé...
Quisera suplantar meu precioso vício e a ponte
Não mais seria tão comprida quanto meus insuportáveis anos.
 
Luzeiro imortal, toca minha sombra e prospera!
 
E eu veria as belas meninas trançadas em dor
Não fossem os infortúnios das sagradas obrigações –
E todos os condados pelos quais meus dedos sangraram
Seriam divinos para meu paladar quando a febre
Começasse a pulular nos vales da memória – o baile
Começará e as tenras raízes inconscientes vacilarão
Quando ouvirem de um murmúrio as primeiras melodias
De luto e comiseração pela vida passada que não vi.
Sob a marquise da loja surrada voltei-me e relanceei
A amurada lúdica que transpôs a madeira de minha alma.
 
Luzeiro imortal, toca minha sombra e prospera!
 
Doçuras encantadas nas cidades perdidas,
Esmurradas crianças esfaimadas, gélidas de fúria,
Minhas inaptidões, como sou fraco! Desistirei! –
Sim, quando a última brisa me assoprar tristemente
Que já não poderei suportar o fardo das experiências,
Pois as mesmas há muito transformaram-se em feridas
Que o tempo não beija porque quer se preservar.
Confiarei em minhas mãos trançadas e em minha prece;
Terei porventura mais radiâncias do que os velhos amores
Que minha amada conheceu sem sequer me consultar?
 
Luzeiro imortal, toca minha sombra e prospera!
 
Todos seremos premiados com a promessa cálida
Estendida dos cálices e das taças transbordantes,
E a aventura dos apaixonados há de gorjear para o sol
Como pássaros magoados junto ao sombral das flores.
Ah, jóias obscuras, quantas vezes pereci por vós!
Quantos beijos deixei de dar por lealdade à vossa voz!
 
Luzeiro imortal, toca minha sombra e prospera!
 
10/09/12



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