Unifica, Senhor, meu coração
e dá-me o espaço azul entre as palavras;
a Tua face inclui tudo o que existe,
e há em tudo o quanto existe o mesmo sopro;
dá-me os frutos refeitos entre as bocas,
a maciez da carne e seus suplícios,
estas cores advindas de Teus gestos.
Senhor, a noite é escura – e eu tão pouco –
e em tudo sou diverso e sou contrário:
o lugar, o desejo... estas distâncias;
vontade de partir entre os amplexos.
Torna, Senhor, um só o meu coração
perdido entre os cenários e as platéias;
faze de mim Teu instrumento e a Espera.
Nunca mais nossas mãos encontrarão
o espaço entre os temores. Nunca mais
sorveremos o azul das tardes calmas,
das carnes mutiladas pelo tempo.
Vês: esta é a salvação que nos destina
os rumos, os retornos, os espasmos,
pois sempre por palavras entreouvidas
nos vem este abandono: este poema.
Que o Senhor nos conceda o som e a fúria
da voz aprisionada entre os soluços,
– do vôo que existe em meio aos céus e as asas –
nudez de tantas pétalas e chagas –,
da afirmação do amor e suas fugas...
Nunca mais nossas mãos trarão verdades.
Como se o nada fosse um dom perfeito
habitamos, em vão, um vago esboço
de onde nos surge a tela e os seus remorsos –
dois olhos mal despertos se entreabrindo.
Nada há mais a dizer – pois tudo é espanto –
mas há impressões que duram a vida toda.
E, mesmo assim, vagamos pela noite,
de repente, cansados do infinito,
habitantes dos sonhos e das pragas,
nada sabendo sobre o tempo... Toda
palavra se renova em seu ofício,
todo verso vasculha velhas cinzas.
Como quem redescobre antigas chagas,
olhamo-nos como quem olha um berço.
domingo, 13 de março de 2011
A LÍRICA MÍSTICA DE SILVÉRIO DUQUE III
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Silvério Duque
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