sábado, 26 de março de 2011

HELENA FIGUEIREDO: POEMAS


REGRESSOS

Se me contassem que se podia trasladar um corpo ido,
e te nasciam de novo raízes no meu peito,
iria desprezar o impostor.
Mas como posso desprezar a noite onde me deito,
este ninho que acolhe os meus segredos,
que me traz teus braços de deleite,
e te aconchega junto a mim.
Seria mentira dizer que não te quero mais,
que vou voar agarrada ao sol,
para que não me possuas, na minha cama nua,
agora, que sei onde te encontro sempre,
espero que os olhos se fechem de repente,
para no sonho, poder enfim, ser tua.


EVIDÊNCIAS

Hoje, que nada nos chama,
as horas
pendem vagarosas no espelho,
e o corpo
espanta-se,
nos fatos desabotoados,
na curvatura das costas,
naquela ruga que apareceu num dia mau.
Crescemos numa aparência sem nexo,
e atordoados,
procuramos as flores,
a confusão das cadeiras,
os brinquedos que viviam no corredor.
Precisa de óleo a dobradiça do armário,
e os joelhos,
gritam a idade
esquecida de virar no calendário.

2 comentários:

  1. Muito, muito bons, ambos, Regressos e Evidências. Gostei imensamente. Um grande abraço à Poeta e ao Editor/Poeta que nos proporciona leituras desta dimensão.

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  2. Gosto muito da poesia de Helena, sem dúvida uma grande poeta portuguesa que ainda vai ter muito reconhecimento.

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