sábado, 24 de outubro de 2009

A ARTE GREGA: ESSÊNCIA E TRANSITORIEDADE


Ao elaborar um retrato, os escultores gregos da era clássica não visavam o particular, mas o instante mágico em que o frêmito da individualidade se lê à superfície de uma ideia abstrata: Martin Robertson detecta com fineza, em bustos de Platão derivados de originais helênicos, uma surpreendente semelhança com Sócrates, cuja persona o discípulo tinha assumido em seus escritos. Analogia que, longe de ser uma coincidência, era procurada e às vezes sublinhada com certa infelicidade pelo escultor: ao vê-los, reconhecemos imediatamente nos bustos helenísticos dos filósofos Metrodoro e Hermarco os traços fisionômicos do mestre de ambos, Epicuro. E se nesses dois exemplos o idioma artístico da nova era impõe a semelhança, a iconografia do período clássico soube entretanto sustentar, em seus melhores momentos, o equilíbrio instável entre as imutáveis essências e a existência fugaz, o indivíduo e a ideia.

Joaquim Brasil Fontes, Eros, tecelão de mitos. Ed. Iluminuras

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