Eu vejo em ti as épocas que já viveste
E as épocas que ainda tens para viver.
Minha ternura é feita de todas as ternuras
Que descem sobre nós desde o começo de Adão.
Estás engrenada nas formas
Que se engrenam em outras desde a corrente dos séculos.
E outras formas estão ansiosas por despontarem em ti.
Quando eu te contemplo
Vejo tatuada no teu corpo
A história de todas as gerações.
Encerras em ti teus ascendentes até o primeiro par,
Encerras teu filho, tua neta e a neta de tua neta.
Mulher, tu és a convergência de dois mundos.
Quando te olho a extensão do tempo se desdobra ante mim.
APRESENTAÇÃO DO RECÉM-NASCIDO
A pedra abre os olhos mansos de novilha
Quando a criança nasce no mundo da foice e do martelo.
Deus não sorri nas dobras azuis do quarto
Porque o vento que vem das usinas
Impede que a eternidade passe.
Criança, que vens fazer no mundo soluçante,
Se a luz não é mais luz, a alma não é mais alma,
Se a cor branca sumiu nos hinos de protesto?
Some, criança, desfaze-te em mar, em tango, em ventania;
Faze a pedra calar; as pedras que te trazem
São palmas de aço, o homem chorou para fazê-las;
Um corpo elétrico te espera numa curva do mundo
Para te derrubar quando tiveres dezoito anos,
Como já derrubou teu pai e tua mãe
Que são a fotografia inanimada do que foram.
FIM E PRINCÍPIO
Espírito pavoroso do século,
Não te dedicaria pianos
Nem harmonias de sirenes
Se os demônios não quisessem.
Entretanto chora o mar,
Choram noivas, peixes, mães,
Desde o princípio do mundo;
Apitos de máquinas levarão
Desde o pólo ao equador
Até o final dos tempos
Lamentações de novilhas,
De cegos, órfãos e plantas.
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