quarta-feira, 20 de outubro de 2010

EDIR PINA DE BARROS: SONETOS

(Vernet)



ARREBOL


Nesse horizonte teu eu me declino,
Desmaio aos poucos qual o sol na tarde,
Vou me entregando sem fazer alarde,
Enquanto na igrejinha tange o sino...

Retiro meus mil véus, me descortino,
E perco meu pudor e meu resguarde,
Esqueço que sou frágil, sou covarde,
De amor me morro e perco todo o tino!

E nesse enlace nos tornamos um,
Sem ter receios, sem limite algum,
Enquanto canta ao longe o rouxinol

E nesse instante único, incomum,
Em ti me morro, tal qual morre o sol...
E nos tornamos juntos o arrebol!

CREPUSCULAR


Crepuscular amor que se declina,
Tal qual o sol morrendo no arrebol,
Já não chilreia mais, qual rouxinol,
E não tem mais o encanto, que fascina!

Tal como o dia que se vai com o sol,
Dando lugar à lua peregrina,
Com sua luz de prata purpurina,
Perdeu o seu lugar, que era de escol!

Tal como o sol se vai, agonizante,
Depois de belo dia radiante,
De tanto brilho, luz, pujança!

Perdeu a sua paz, a temperança,
E morre assim tão só, sem esperança,
Na sepulcral tristeza desse instante!

JARDINS SECRETOS

Cultivo dentro em mim jardins secretos
Regados com meus prantos vãos, doridos,
Que permanecem sempre bem floridos,
E de perfumes são também repletos...

Neles cultivo os meus amores idos,
Os sentimentos meus, dos mais diletos,
Os meus penares tolos, mas discretos,
Etéreos sonhos meus, jamais vividos...

Jardins secretos que florescem em mim,
Rebentos dessa dor que em mim se espalma...
Aos meus amores idos, meus legados!

Orquídeas, cravos, rosas cor carmim,
Que viçam sobre húmus de minh’alma,
Nos limos de meus prantos represados...

MORREM OS SONHOS


Morrem os sonhos, todas as quimeras,
Depois de agonizar com mil esperas,
Quais rosas pelo vento desfolhadas,
Nas mais eternas, frias madrugadas!

Morrem os sonhos como morrem as flores,
Perdendo seus encantos, seus olores,
Iluminados tons dos mais singelos...
Pois são de areia todos seus castelos!

Os sonhos morrem quais as borboletas
Que se atirando nos faróis da vida,
Desfazem-se na luz, em mil pedaços!

Morrem os sonhos se não há poetas,
Que os recolhendo, dão-lhes luz, guarida,
E façam versos com seus estilhaços!

QUANTA IRONIA!


Vês? Sou agora um pássaro que voa!
De teu sarcasmo torpe estou liberta,
Não tenho mais aquela vida incerta,
Tua perfídia já não me magoa!

Vês? De ti a minha vida está deserta,
E agora vivo bem, sorrindo à toa,
E dentro em mim teu nome não ecoa,
A tua voz mais nada em mim desperta!

Mas hoje vens aqui! Quanta ironia!
E choras teus sofreres e agonia...
E te humilhas! Dizes que me amas!

Não vês que nada sinto com teus dramas?
Que cinza não restou das velhas chamas?
Não tens pudor nenhum, nem galhardia!

COISAS DO CORAÇÃO


- “Coisas do coração” – Assim me dizes...
Assim traduzes minhas mágoas, dores
Que deixam n’alma tantas cicatrizes,
Levando desta vida seus dulçores...

- “Coisas do coração, dos teus verdores”...
E assim disfarças todos teus deslizes,
Mas nossos dias já não são felizes
E vão morrendo em mim os meus fulgores.

Tu nem percebes que me vou aos poucos,
Que agoniza dentro em mim o amor,
O mesmo amor que já foi teu um dia...

- “Coisas do coração! Ciúmes loucos!”
Se ouvisses meus queixumes, meu clamor,
Até o fim da vida amar-te-ia...

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