sexta-feira, 8 de abril de 2011

AGUSTINA BESSA LUÍS: AFORISMOS



As primeiras impressões não são decisivas. Às vezes são fatais mas não decisivas.

Humilde é a pessoa que não afasta de si a crença do Infinito, a realidade das suas pequenas pegadas na vida - e não aquela que se desmerece, que insulta o seu corpo e a sua alma, que se enfurece contra si mesma. Aceitar a sua humilhação é consentir na humilhação do seu próprio Deus.

As guerras não surgem por motivos económicos ou passionais. É uma atitude de indivíduos abandonados à razão, incluindo a razão do seu mundo interior isolada do mundo exterior.

A frivolidade é também uma forma de hipocrisia porque as pessoas não são aquilo. A pessoa, quanto mais frívola nos parece, mais esconde a sua natureza profunda.

Custa tanto escrever um bom livro como um mau livro; mas só merece respeito a Arte que é em nós uma imposição, um destino, um fogo inconsumível de espírito, ainda que a obra, relativa à nossa exigência, nos pareça medíocre.

Mas o que são os vaidosos senão os que temem a sua nudez? Os que evitam o retrato da alma para não lhes descobrir tormento e debilidade?

É extraordinário como nos tornamos violentos quando queremos agradar ao mundo. Agradar ao mundo resume o comportamento da sociedade nos seus aspectos mais retóricos.

A intimidade excessiva desencadeia a hostilidade.

Pode-se não recordar os insultos; mas guarda-se deles um amargo de experiência, feia como uma cicatriz. E isso envelhece a alma, torna-a ruinosa e inútil.

A infância vive a realidade da única forma honesta, que é tomando-a como uma fantasia.

O humor ilude-nos como uma faísca num campo escuro. A verve um tanto imoderada, uma corrupção do sentimento que se faz galhofa, um medo de ganhar nome de suspeita virilidade. Quem não troça é beato ou é eunuco.

O humor é, nas pessoas, um elemento terrivelmente desconhecido. Pode unir um povo inteiro como o não fazem os costumes e a própria língua.

Na nossa sociedade, que se entende por permissiva, não há afinal homens exemplares. Há só leis que substituem o exemplo; há só alíneas morais que estão em vez dos actos reais e da sua humanidade.

Parte da originalidade dum escritor depende das fontes dos seus plágios. É preciso dominá-las bem para poder usá-las da maneira mais convincente.

O homem faz tentativas duma obra, a mulher opera sem necessidade de completar alguma coisa. Ela é um ser completo, princípio e fim, lugar, caso, dispersão do conflito em que a própria morte se descreve, se anuncia.

Um comentário:

  1. Augustina Bessa-Luís, uma das maiores, senão a maior escritora lusitana, tem poucos livros editados na Brasil. Uma lástima!
    Em 2004 ganhou o Prêmio Camões, o mais importante da língua portuguesa. No Brasil, infelizmente, quem quiser conhecer sua extensa obra terá alguma dificuldade, pois as poucas obras que foram editadas já estão esgotadas.
    Uma lástima!
    Adorei seu blog.

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