quarta-feira, 26 de junho de 2013

LUÍS AUGUSTO CASSAS: POEMA

(Iberê Camargo)
 
 
APOCALIPSE (2)
 
1
Nos tempos em que eu transformava pães em pedras
o sol mergulhava na matéria
e produzia ferimentos em meu coração
Vãos eram os pensamentos palavras e obras
e minha alma inconsolado deserto: covil de cactos
constelação de escorpiões
 
Época de as serpentes trocarem as peles
e a vaidade eclipsar as cores do camaleão
O amor se transformou em cólera
a paz em campos de concentração
A humildade vestiu o manto do orgulho
a aparência triunfou sobre a essência
a fé foi derrotada pela tentação
 
2
Quando aprendi a transformar pedras em pães
o sol ergueu-se da imersão na matéria
e proclamou a temporada da transfiguração
Nova fonte de luz jorrou em meu espírito
e veio ter comigo o anjo da alegria
Rosas brotaram das chagas do coração
 
Desde então tenho colhido safra de milagres
e os gafanhotos foram expulsos das plantações
A serpente foi vencida pela pomba
o egoísmo tornou-se confraternização
o prazer buscou o sentido da vida
a morte transformou-se em vida eterna
a glória da vida vencera a tentação
 
3
Bem sei
que pães alimentam
e pedras apedrejam
 
Mas sei também
que pedras podem alimentar
e pães apedrejar
(Ó granito da vida
quando te dissolverás?)
 
Humilde ao raiar do dia
quedo-me contrito ao divino alquimista
que transmuta a pedra dos meus sofrimentos
no pão de sua perfeição
 
Eu só vivo
porque Ele morre
Eu sou o forno
Ele é a quinta-essência
Ele é a luz eterna
Eu sou o trigo
Eu sou a gota de sangue
Ele é o coração

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